Friday, October 20, 2006

O encontro

Noite de lua cheia. As máscaras caíram ao se despirem. Despiram-se dos jogos, de brincar de gato e rato. E junto às roupas e máscaras ao chão, lá estavam atentos; o tigre, o gato, o adolescente e o sábio. Eles sabiam do desfecho de antemão e por isso espreitavam.
Minutos antes desse momento, as palavras eram um emaranhado, um novelo sem comeco nem fim. As idéias obscuras, embacadas pelo desejo. Enigmas criados com um único intuito. A aproximacão. As palavras eram belas, mas os levavam a um labirinto sem fim. O que faltava era o toque, o afago. E foi assim que ela deixou-se levar. Após uma batalha árdua, ela rendeu-se e assim libertou-se. A fantasia ficou mais leve, natural e viva, rodopiando entre eles.

A Woman of The Full Moon - Original Art by Zeljko Djurovic

Wednesday, October 18, 2006

O Cavaleiro e a Flor

O cavaleiro lidava com a frieza da guerra, a fúria, o ódio, a luta por territórios, sangue, sacrifícios. Porém, mesmo no meio desse ambiente frio, ele permanecia com sua alma intacta e seu coracão aquecido por imagens oníricas, de grama verde, de cavalos no pasto. Assim ele sentia-se vivo.

Um belo dia, andando por entre os escombros da guerra, deu uma passada maior e... Ops! Quase pisa em uma pequena florzinha branca. Ela resplandecia, por entre o chão duro e sem vida.
Ele, com o maior cuidado, conseguiu desviar. Quando bateu o olho naquela flor, seu coracão saltou. De alegria e esperanca.

A flor, que por muitas vezes passou por situacoes semelhantes, sorriu de alívio. Porém, dessa vez, com seus olhos de flor conseguia ver espectros coloridos naquela alma. Não eram as mesmas cores que estava acostumada a ver passar. Este tinha uma alma clara. Brilhava. Tinha verde também, assim como as plantas.

O cavaleiro, estarrecido por encontrar uma flor tão delicada e viva por entre os destrocos, compadeceu-se. Decide aguá-la todos os dias. Até onde ela conseguiria sobreviver. A flor, toda contente e faceira, agradecia a cada gotinha de água. Para ela eram como bencãos do céu.

O amor do cavaleiro pela florzinha, foi alimentando-a aos poucos. E ela foi crescendo. Ele, sempre pontual, não deixava de comparecer ao encontro.
A flor foi se espichando. Ramos e galhos apareceram. Mais flores brotaram. E o amor pelo cavaleiro foi criando raízes mais fortes. Agora ninguém pisaria mais na florzinha indefesa, pois em seu lugar havia uma estrondosa e robusta árvore, repleta de frutos suculentos, que alimentavam quem passava. Já não havia mais a necessidade de aguá-la, pensava o cavaleiro.
O cavaleiro decide parar de visitá-la. A árvore estrondosa poderia viver por si própria. Ele, por sua vez, estava muito ocupado com seus afazeres de guerra. E diz para si mesmo que agora ela deve cuidar da sua vida. Agora ela tem forcas para ir em frente.

A partir deste momento, a árvore comeca a perder suas folhas. Em pouco tempo a árvore perde seu vico. Seus frutos são amargos.
O cavaleiro não tinha idéia de que seu amor pela frágil florzinha pude-se ser a base de seu alimento. E foi.

Monday, October 02, 2006

Crepúsculo

Na cidade, em meio a barulhos, enxergo as luzes embacadas. Nada claro, tudo distorcido. Forco a vista, para ver se enxergo melhor. Miopia total. Isso sempre acontece na hora que os dois mundos se encontram. A claridade e a escuridão. O crepúsculo. Totalmente sem foco, percebo que o que via nele eram apenas flashes de um sonho distante. As imagens da cidade se confundem com o seu sorriso embacado. Agora o vejo distorcido, envolto em uma névoa de sarcasmo. Tento novamente forcar a vista para ver se enxergo algo além daquelas palavras frias. Não, sem resposta. A distância continua a mesma. Me esforco mais uma vez, agarrada a esperanca e a lembranca de dias felizes. De caras e bocas engracadas. De docilidade. Não. Não vejo mais. Foi sumindo, assim como o sol no crepúsculo e a chegada da noite.